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Liturgia

Os ritos tradicionais são uma necessidade

Os teólogos contemporâneos e muitos católicos fazem uma confusão tremenda entre o grau de pureza das eras antigas da Igreja e o grau de perfeição da Tradição.

A época apostólica e dos mártires tinha instituições mais sumárias porque possuíam, de modo geral, uma santidade mais perfeita, e porque não havia tempo. A Cruz estava marcada em seu coração e o Espírito iluminava e fortalecia frequentemente sua mente e vontade; o rito eucarístico e as fórmulas doutrinais podiam ser bem mais simples.

Os Padres possuíam uma inteligência mais mística dos mistérios, por isso sua teologia poderia apoiar-se em filosofias mais religiosas sem o rigor aristotélico (de índole platônica ou helenística); era uma época em que os sucessores dos Apóstolos (bispos) e dos mártires (eremitas e monges) viviam mais próximos dos paradigmas ideais.

Mas a teologia escolástica, apoiada numa filosofia mais científica (aristotélica), e as ordens mendicantes, adaptadas à vida citadina, representam a condição de uma vida cristã “normalizada” e voltada para as boas inteligência e virtude “médias”; por isso, constituem uma condição de certo modo “definitiva”, útil na paz e nas perseguições (nestas obviamente poderia faltar o Espírito das origens, mas isso nada obsta à excelência dos instrumentos teóricos e práticos legados pela Igreja medieval).

Nem é estranho que nessa condição “normal” tenham brotado as duas expressões máximas da sabedoria e do heroísmo cristãos depois da era apostólica: S. Tomás e S. Francisco, que tiveram ocasião de manifestar extensivamente a inteligência e a encarnação do mistério (de fazer o que Cristo e os Apóstolos fariam se não vivessem sob o peso da urgência e o risco de morte).

Para um santo bastam as palavras da consagração; para o cristão médio, os ritos tradicionais são uma necessidade. Mas o santo ainda assim preferirá a Missa tradicional como o bem comum e a expressão ritual perfeita de sua [da de Cristo a quem ele está conformado] vivência intensa da Cruz.

Para um místico, basta um versículo da Escritura ou a oração de Jesus; para o cristão médio, o entendimento da Vida de Cristo lhe será facultado pela Suma Teológica. Mas o místico não a desprezará, antes encontrará nela, de modo raciocinado, o que ele inteligiu compactamente, e isto será necessário a sua pregação.

A ideia de que se possa despojar a Igreja das riquezas acumuladas, como se fossem “peso morto”, e “voltar às fontes”, não é razoável e, a rigor, é orgulho: é pressupor a própria sabedoria e santidade (que só precisaria contar com meios mais simples), e é ainda pressupor a própria situação (imaginada) como regra para todos.

Só o santo volta à Fonte, mas ele ama o grande rio da Tradição, não pretende assoreá-lo.

Esse despojamento não é verdadeiro enriquecimento, não é obra da santidade. O protestantismo, intento de “cristianismo despojado”, tornou-se um cristianismo adequado ao mundo, mostrou a inviabilidade desse caminho. A nova teologia deveria ter aprendido.

– Joathas Bello

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