Tradução e adaptação de um texto do Pe. Paul Carr, publicado no informativo americano da Fraternidade de São Pedro de outubro de 2014, que trata da Coleta, uma das partes do Próprio da Missa no rito gregoriano:
É um infortúnio o fato de que a oração nem sempre é entendida ou apreciada o bastante por seu papel e valor na vida católica. Uma falácia comum é restringi-la a uma medida de emergência: em face de uma dificuldade ou perigo, se todas as outras possibilidades se esgotaram, aí falamos com Deus como último recurso. Uma outra limita a oração a não mais que dizer a Deus o que queremos que Ele faça por nós ou nos dê, tratando-O como um benfeitor celestial. Ainda há outro erro que confunde a oração com a recitação de orações, como se o valor da prece consistisse no número de palavras usadas ou no número de vezes em que ela foi recitada. Embora nenhuma dessas ideias seja completamente falsa, elas representam um quadro tão incompleto da verdadeira natureza da oração que podem limitar gravemente o bem que a prece pode fazer por nós, e o bem que podemos fazer através dela.
O entendimento da verdadeira natureza da oração é ainda mais importante quando consideramos nossa presença no Santo Sacrifício da Missa: se devemos evitar uma diminuição do sentido da oração nas nossas vidas pessoais, muito mais devemos quando assistimos ao culto solene que a Igreja, como Corpo Místico de Cristo, oferece ao Céu em união com seu divino Fundador e Cabeça. Se aplicarmos essas noções limitadas de oração à nossa participação durante a Santa Missa, veremos nascer nas almas uma postura do tipo “o que eu ganho aqui” ou uma ligação exagerada aos textos, à recitação das respostas, como se a participação fosse limitada a esse nível.
É significante que o rito da Missa assuma que existam outras pessoas presentes além do celebrante, e que elas têm um papel a cumprir. Mesmo que a assistência de um acólito seja presumida, o rito requer que o celebrante se dirija à nave (não ao acólito) e convide os presentes a participarem, como vemos no Dominus vobiscum, quando o sacerdote insta a assembleia a rezar com ele, não a vê-lo rezar. Isso ocorre porque a Missa, assim como todos os atos litúrgicos da Igreja, nunca são atos pessoais do sacerdote (mesmo que seja ele, in persona Christi, o agente por meio do qual Cristo atua nos sacramentos), mas são realizados em nome e para o benefício do Corpo Místico, isto é, de todos os membros da Igreja. Então, quando não há assembleia, ou mesmo um acólito, o celebrante ainda dirá Dominus vobiscum e Oremos, pois age por toda a Igreja no seu ministério no altar.
Por essa razão, o Papa São Pio X encorajou os católicos a não apenas rezar na Missa mas rezar a Missa. Isso não significa ler a tradução do rito enquanto o sacerdote vai em frente na celebração, como se fosse o texto de uma opera num programa teatral, mas indica uma postura que nos chama a entrar oracionalmente no espírito da liturgia, ou seja, a elevar-nos a Deus antes, durante e depois do Santo Sacrifício, como sinal no nosso dever de culto a Deus, do nosso amor à Santa Eucaristia (Vítima Divina da nossa salvação e Sacramento Permanente da Nova Aliança) e do nosso desejo de crescer na graça de Deus e na caridade aos irmãos. Então, através da Missa, seremos repetidamente saudados pelo Dominus vobiscum (que deseja a presença e graça de Cristo para participarmos frutuosamente do Sacrifício), convidados a orar, e, um pouco antes do Prefácio, provocados pelo Sursum corda a verdadeiramente elevar os corações a Deus.
O Papa Pio XII, na Mediator Dei, diz que esse recolhimento oracional vai se expressar de diferentes maneiras segundo a diversidade de almas. Para algumas, a melhor maneira de rezar será seguindo as orações do Missal e fazê-las suas. Para outras, contemplar o mistério do Santo Sacrifício, enquanto a liturgia se desenvolve às suas vistas, será o melhor método. Para outras, será se juntar ao canto das respostas e assim por diante. O importante é ter consciência de que nossa assistência à Santa Missa é um tempo de oração, e não apenas um modo de preencher o domingo e evitar o pecado mortal, ou, ainda, de ser visto pelos outros praticando a religião; nela, como dissemos, temos de unir nossas mentes e corações ao trabalho redentor de Nosso Salvador.
É devido a esse tipo de postura que todos que participam da Missa devem ter que as petições contidas na Coleta são expressas no plural: por isso o celebrante diz “…suplicamos, Senhor…” e não “Eu suplico”. Também é por esse motivo que a fórmula conclusiva da Coleta (geralmente Per Dominum nostrum…) termina com a resposta da assembleia (ou de quem responde por ela): Amen. Essa palavra em hebraico significa “assim seja” e expressa nosso consentimento ao que acabou de ser dito. Nossa oração é tão importante (em outras palavras, nossas intenções, esperanças, petições, amor e adoração a Deus durante esse momento) que a congregação é que dá a última palavra. Seja cantando ou repetindo-a silenciosamente em nossos corações no momento apropriado, é nossa chance de dizer “Eu concordo” – eu adiciono minha voz, meu coração e farei o que o celebrante acabou de rezar em meu nome e no dele.
Quando realmente dissermos Amen à Coleta, saberemos que respondemos ao convite do sacerdote no Oremos e cumprimos nosso papel no Santo Sacrifício.