Com toda a vênia devida a um Sucessor dos Apóstolos e invocando o Cân. 212 do CDC, o qual me dá direito de manifestar as minhas necessidades aos Pastores e dar minha própria opinião sobre o que afeta o bem da Igreja, eu vou comentar um trecho de um texto de Dom Henrique Soares da Costa, na época, Pe. Henrique, sobre a Missa Gregoriana, ou Tridentina.
O texto se encontra aqui.
Escreve o atual Bispo de Palmares:
Há um endeusamento da Missa de São Pio V que é errado, fora de contexto e trai a grande tradição litúrgica da Igreja. A Igreja tem, teve e terá sempre o direito e o dever de modificar seus ritos, de acordo com as circunstâncias e o discernimento da legítima autoridade apostólica, desde que não fira a essência mesma da estrutura sacramental.
No livro A Reforma Litúrgica Romana, prefaciado pelo então Cardeal Joseph Ratzinger, o Monsenhor Klaus Gamber, ao analisar as reformas anteriores a de Paulo VI, chegou às seguintes conclusões:
- O Rito Romano remonta, nas suas partes mais importantes, pelo menos até o século V, e mais precisamente o Papa São Dâmaso (366-384);
- Desde os primeiros séculos, todos os Papas respeitaram as tradições locais para o que diz respeito às partes do Ordo que não fazem parte do cânon;
- Na Idade Média, as dioceses e as igrejas não tinham adotado instantaneamente o Missal em uso em Roma, usavam o próprio e nenhum Papa manifestou desgosto ou surpresa com isso;
- Foi a partir da Reforma Protestante e para defender a Europa dessa heresia, o Concílio de Trento pediu ao Papa para uniformizar o Missal na Igreja Ocidental;
- Mas tal uniformização não se deu de maneira impositiva, o Papa preservou as tradições locais nos ritos que tivessem mais de 200 anos. Embora pudesse não fazê-lo e ter uniformizado a Missa em todo o Ocidente, o Papa optou por respeitar tais liturgias numa época que não se falava em pluralismo e tolerância.
- As outras reformas na liturgia foram de pequenos trechos e no calendário, sendo a maior reforma no rito em si até então a de Pio XII, da Semana Santa.
Os Papas sempre respeitaram as tradições locais e os ritos da Igreja Ocidental e Oriental, então a imposição de um rito fabricado de forma precipitada e artificial a toda a Igreja Latina é uma quebra brusca e forçada com o desenvolvimento orgânico de 2000 anos. Portanto, há aí uma traição à grande tradição litúrgica da Igreja sim, ao contrário do que defende o prelado.
O ponto aqui não é se a Missa de Paulo VI é católica, herética, válida, lícita. Isso é irrelevante em uma discussão séria e a Missa Nova é perfeitamente católica. O ponto central, e muitos não percebem, é uma imposição ditatorial de um Papa – que deveria ser o Supremo Pastor, e não o Supremo Ditador – que destruiu as tradições ímpares de várias dioceses (tais quais as de Braga, em Portugal, ou a de Milão, na Itália) e ordens religiosas (destruindo o Rito da Santa Cruz, o Rito dos Dominicanos dentre outros).
Em resumo: a Reforma Litúrgica de 1969 foi um verdadeiro etnocídio aos vários ethos católicos existentes até a década de 60. Foi a renovação que veio para a destruição.
Então, excelência, não há um “endeusamento”, no sentido pejorativo que quis dar ao termo. O que há é uma resistência a uma uniformidade forçada à Igreja Latina. “A Babilônia era a uniformidade”, disse Bento XVI.
5 respostas em “Resposta a Dom Henrique Soares”
Esse texto foi publicado aos 19 de abril de 2007 no diário do então Pe. Henrique Soares da Costa (sagrado só em 2009):
http://costa_hs.blog.uol.com.br/arch2007-04-15_2007-04-21.html#2007_04-19_22_51_04-2574690-0
Quase três meses depois, Bento XVI publicava o Summorum Pontificum.
Isso mesmo. Faz tempo!
Sim, eu sei. Mas até agora não vi nada que ele falou ou escreveu que tenha mudado de opinião. Então, pressuponho que ele continua pensando assim.
Aparentemente, assim é; mas, data venia a D. Henrique, poucos eclesiásticos de notoriedade pública assumiram que Bento XVI os fez reavaliarem sua posição – como Pe. Paulo Ricardo, p.ex.
[…] o Vaticano II e a estrutura construída em torno dele (isso já foi, inclusive, algo de crítica num texto aqui do site escrito por Cláudio); mesmo assim, ele estava muita cima da média do episcopado […]