Todas as coisas criadas são intermediários, sinais, aparências. Mas algumas, dentre elas, são intermediários em segundo grau, sinas de sinais, aparências de aparências. Assim sucede com o dinheiro, as honrarias, os títulos, os prazeres artificiais, etc. E são precisamente estes fantasmas o objeto preferido da idolatria moderna, são estes bens ultra-relativos os que mais captam o nosso desejo de absoluto. Já se não adora o sol, as plantas ou os animais (que pelo menos têm o mérito de serem intermediários necessários entre o homem e o seu fim supremo), mas sim uma etiqueta política, uma condecoração, uma nota de papel.
Como o culto antigo de Cybelis, o de Cypris, ou mesmo o de Príape, que correspondiam às profundas realidades naturais, se revelam sãos e vivos em comparação com o culto actual dos mais vãos elementos da nossa existência! A idolatria moderna rege-se pela lei do menor coeficiente de realidade. E ainda quando se abate sobre coisas necessárias e naturais, as despoja da sua realidade, da sua substância, fá-las sobras e joguetes. Assim, a idolatria do amor sexual não adora, na mulher, a esposa ou a mãe tal como Deus a quis; substitui-a, segundo incida sobre o corpo ou sobre a alma, quer por um instrumento de prazer estéril, isto é, um ser degradado, quer por um produto de sonhos impossíveis, isto é, um ser imaginário. A idolatria antiga (pelo menos na sua fase inicial) elevava para Deus as coisas da natureza, enquanto que a idolatria moderna as degrada até ao nada.
– Gustave Thibon (O pão de cada dia. Colecção Éfeso, Lisboa: Editorial Aster)