Em 2013 escrevi um pequeno texto, com algumas informações veladas, tratando da história da retomada das celebrações no rito romano tradicional em Recife até 2012. De lá para cá muita coisa ocorreu: mudamos de igreja, passamos pela pandemia, tivemos a ajuda de novos padres, o número dos fiéis cresceu muito, Roma se tornou hostil, etc, de modo que uma novo registro se fazia necessário. Felizmente participei de uma entrevista para o canal Cadeira do Coroné onde isso se cumpriu e agora compartilho ela com os leitores deste site:
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Tradução de um texto do Dr. Peter Kwasniewski:

Todos os anos, nos ritos ocidentais da Igreja Católica, o aniversário ou nascimento de São João Batista, Precursor do Senhor, é comemorado no dia 24 de junho, exatamente a seis meses da natividade de Jesus Cristo Nosso Senhor. A explicação mais simples para a data é que, como diz o Missal Diário de Santo André, “no Evangelho de 25 de março lemos que o anjo Gabriel anunciou a Maria que três meses depois [ou seja, no final de junho], Isabel, em virtude de um milagre divino, teria um filho.”
Mas há também uma explicação alegórica dada por todos os comentaristas litúrgicos de todos os tempos. Como disse o próprio João, a respeito do Messias: “Ele deve crescer, eu devo diminuir” (Jo III, 30). Perto do Natal, no hemisfério norte, cai o dia mais curto do ano, quando a escuridão está no auge; depois disso, a luz aumentará lentamente. Da mesma forma, perto do nascimento de São João cai o dia mais longo do ano, após o qual a luz – a luz de João – diminuirá. O próprio ciclo da natureza proclama o relacionamento correto entre o Filho e Palavra de Deus e todos os Seus discípulos, não importa quão grandes sejam.
Aqueles que estudam a história litúrgica, arquitetônica e artística de nossos tempos, nos quais São João Batista é, para ser franco, uma figura quase marginal na vida católica, podem ficar surpresos ao descobrirem a magnitude da devoção tradicional ao Batista, o maior dos profetas, ao longo de todos os séculos da Igreja, nas terras orientais e ocidentais. Na Europa havia milhares de igrejas dedicadas a ele, estátuas e inúmeras janelas, pinturas de todos os tipos. Ele era um dos patronos mais populares dos lugares. Depois da Virgem Maria, praticamente não há santo mais invocado.
Podemos ver a evidência desta devoção no rito romano clássico. Ele não só tem duas festas, uma das quais (a da Natividade) também tem uma Missa de Vigília própria, e uma das quais (novamente a da Natividade) desfruta de uma oitava; mas em cada celebração da Missa Tridentina ele é invocado seis vezes no Confiteor repetido três vezes; novamente na grande oração Suscipe, Sancta Trinitas no final do Ofertório; mais uma vez no Cânon Romano; e finalmente no Último Evangelho. Isso significa nove vezes em cada missa.
Para comparação, antes de 1962, São José não era invocado uma única vez sequer.
No texto do Confiteor tradicional lemos:
Confiteor Deo omnipotenti, beatae Mariae semper Virgini, beato Michaeli Archangelo, beato Ioanni Baptistae, sanctis Apostolis Petro et Paulo, et omnibus Sanctis, quia peccavi nimis cogitatione, verbo et opere: mea culpa, mea culpa, mea maxima culpa. Ideo precor beatam Mariam semper Virginem, beatum Michaelem Archangelum, beatum Ioannem Baptistam, sanctos Apostolos Petrum et Paulum, et omnes Sanctos, orare pro me ad Dominum Deum nostrum. Amen.
Confesso a Deus Todo-poderoso, à bem-aventurada sempre Virgem Maria, ao bem-aventurado Miguel Arcanjo, ao bem-aventurado João Batista, aos santos Apóstolos Pedro e Paulo, e a todos os santos, que pequei muitas vezes por pensamentos, palavras e ações, por minha culpa, minha culpa, minha máxima culpa. Por isso, peço à bem-aventurada sempre Virgem Maria, ao bem-aventurado Miguel Arcanjo, ao bem-aventurado João Batista, aos santos Apóstolos Pedro e Paulo, e a todos os santos, que oreis por mim a Deus, Nosso Senhor. Amém.
Na Suscipe, sancta Trinitas, última oração do Ofertório temos:
Suscipe, sancta Trinitas, hanc oblationem, quam tibi offerimus ob memoriam passionis, resurrectionis, et ascensionis Jesu Christi, Domini nostri, et in honorem beatæ Mariæ semper Virginis, et beati Ioannis Baptistæ, et sanctorum apostolorum Petri et Pauli, et istorum, et omnium sanctorum: ut illis proficiat ad honorem, nobis autem ad salutem: et illi pro nobis intercedere dignentur in cælis, quorum memoriam agimus in terris. Per eumdem Christum Dominum nostrum. Amen.
Recebei, ó Trindade Santíssima, esta oblação, que vos oferecemos em memória da Paixão, Ressurreição e Ascensão de Nosso Senhor Jesus Cristo, e em honra da bem-aventurada e sempre Virgem Maria, de São João Batista, dos santos apóstolos Pedro e Paulo, e de todos os Santos; para que, a eles sirva de honra e a nós de salvação, e eles se dignem interceder no céu por nós que na terra celebramos sua memória. Pelo mesmo Cristo, Senhor Nosso. Amém.
Quão poderoso é lembrar – e ainda assim tantas vezes esquecido! – que o Santo Sacrifício da Missa é oferecido não apenas “em memória da Paixão, Ressurreição e Ascensão de Nosso Senhor Jesus Cristo”, mas também “em honra da bem-aventurada e sempre Virgem Maria, de São João Batista, dos santos apóstolos Pedro e Paulo, e de todos os Santos.”
A menção mais uma vez aos dois padroeiros da Igreja de Roma lembra-nos que apenas cinco dias depois da Natividade de João Batista, no dia 29 de junho, acontece a solenidade dos Santos Pedro e Paulo, que também são, como João, mencionados nove vezes cada: seis vezes no Confiteor três vezes repetido; uma vez aqui, na Suscipe; uma vez no Cânon Romano; e uma vez na Embolia após o Pai Nosso. Para quem conhece a numerologia, nove é um número especial porque homenageia a Santíssima Trindade (3+3+3 ou 3×3), como no Kyrie nove vezes do autêntico rito romano da Missa.
O Cânon Romano menciona o Batista na segunda lista de santos, após a Consagração:
Nobis quoque peccatoribus, extensis manibus ut prius, secrete prosequitur: famulis tuis, de multitudine miserationum tuarum sperantibus, partem aliquam, et societatem donare digneris, tuis sanctis Apostolis et Martyribus: cum Joanne, Stephano, Matthia, Barnaba, Ignatio, Alexandro, Marcellino, Petro, Felicitate, Perpetua, Agatha, Lucia, Agnete, Cæcilia, Anastasia, et omnibus Sanctis tuis: intra quorum nos consortium non æstimator meriti, sed veniæ, quæsumus, largitor admitte. Per Christum Dominum nostrum.
Também a nós, pecadores, vossos servos, que esperamos na vossa infinita misericórdia, dignai-vos conceder um lugar na comunidade de vossos santos Apóstolos e Mártires: João, Estevão, Matias, Barnabé, Inácio, Alexandre, Marcelino, Pedro, Felicidade, Perpétua, Águeda, Luzia, Inês, Cecília, Anastácia, e com todos os vossos Santos. Unidos a eles pedimos, vos digneis receber-nos, não conforme nossos méritos mas segundo a vossa misericórdia.Por Jesus Cristo Nosso Senhor. Amém.
Que “João” aqui não é outro senão o Batista é reconhecido por todos os comentaristas litúrgicos (ver, por exemplo, Arcebispo Amleto Cicognani, The Saints Who Pray with Us in the Mass, Romanitas Press, 2017, p. 26).
O Último Evangelho, retirado do Prólogo do Evangelho de João, inclui estas palavras (João I, 6-8):
Fuit homo missus a Deo cui nomen erat Joannes. Hic venit in testimonium, ut testimonium perhiberet de lumine, ut omnes crederent per illum. Non erat ille lux, sed ut testimonium perhiberet de lumine.
Houve um homem enviado de Deus, cujo nome era João Este veio como Testemunha para dar testemunho da luz, afim de que todos cressem por meio dele. Não era Ele a luz, mas veio para dar testemunho da luz.
Como é triste refletir sobre o fato de hoje em dia, em quase todas as celebrações do Novus Ordo, o nome de São João Baptista, o maior homem nascido de mulher, não ser mencionado sequer uma vez. (a não ser quando o Cânon Romano é escolhido).
Este é o tipo de coisa que os tradicionalistas têm em mente quando falam das diferentes espiritualidades das antigas e novas “formas” da Missa. A visão de mundo devocional daqueles que foram educados na produção artificial de Paulo VI não é a mesma que a de nossos antecessores na Fé e daqueles que mantêm a forma tradicional de culto. Graças a Deus, cada vez mais católicos começam a ver o imenso valor de se reconectarem com o seu direito de nascença: a lex orandi e a lex credendi da Igreja Romana de todos os tempos.
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Nota do tradutor:
Na Tradição Bizantina, existem seis Festas de São João Batista:
1) Sua concepção em 23 de setembro;
2) Sua Natividade – 24 de junho;
3) Sua decapitação – 29 de agosto;
4) Sinaxe de São João Batista – 7 de janeiro (um dia após a Teofania);
5) A Primeira e a Segunda Descobertas do Cabeça de São João Batista – em fevereiro;
6) A Terceira Descoberta da Cabeça de São João – 25 de maio.
25 de maio, Festa da Terceira Descoberta da Cabeça de São João Batista, foi o aniversário terrestre (e dia de batismo) de São Padre Pio (ele foi batizado no mesmo dia em que nasceu); 23 de setembro, Festa da Conceição de São João Batista, foi o dia em que faleceu São Padre Pio.
Recentemente colhi o seguinte depoimento de Lincoln Haas Hein no Facebook sobre as Primas e Completas do Ofício Parvo na vida do leigo (fiz uma sistematização com um comentário do autor ao seu post original e pequenas harmonizações no estilo):

Comentei com um amigo após algumas pesquisas algo que vale a pena ser divulgado aqui sobre as Horas litúrgicas de Prima e Completas no Ofício Parvo de Nossa Senhora:
Pesquisando sobre o Ofício seja o Parvo seja a Liturgia das Horas, vi que era costume muito difundido antes do Concílio os leigos rezarem a Prima como oração da manhã ao acordar e as Completas como oração antes de dormir (algo que fazia mais sentido do que rezar Laudes e Vésperas dentro do contexto da vida cotidiana laical).
A Hora Prima tradicionalmente significa uma consagração do dia e do trabalho pedindo a proteção de Deus e um relembrar das obrigações cotidianas (enquanto as Laudes são mais dedicadas ao puro louvor, a uma consagração do cosmos e a adoração) – nos ambientes monásticos e religiosos geralmente estava associada a um capítulo matinal que distribuía tarefas e pode por um leigo ser associada a uma meditação breve sobre os bons propósitos para o dia que se inicia, e sobre as questões e trabalhos que deve resolver ou lidar (colocando tudo nas mãos do Senhor pela manhã).
Os três salmos da Prima do Ofício Parvo romano são particularmente interessantes:
1- O primeiro pede proteção contra os maus – contra o mundo e o demônio;
2- O segundo pede conversão – contra a carne e as concupiscências; também recorda a encarnação e a segunda vinda de Cristo: muitos trechos dele são usados em antífonas das missas no tempo do advento. É um salmo de esperança.
3- O terceiro é um salmo curto que no rito romano após São Pio X e no rito novo substitui os tradicionais laudade (148, 149, e 150) como salmo de louvor nas Laudes em um dos dias da semana. É um salmo que fala da fidelidade de Deus em sua verdade e misericórdia: é quase um paralelo louvando em Deus o que se diz em outro salmo “Verdade e amor são os caminhos do Senhor para quem guarda sua Aliança e seus preceitos” e assim relembra o nosso dever de corresponder ao amor e fidelidade divinas com verdadeiros e sinceros atos de fidelidade e amor. É um salmo que serve tanto para combater o demônio e o orgulho da vanglória dando louvor a Deus quanto para ter algo do louvor das Laudes renovado.
Já nas Completas há o exame de consciência do dia que passou e há uma entrega confiante em Deus para que proteja e guarde durante as horas do sono. No Ofício Parvo romano rezam-se os salmos graduais do 128 ao 130:
1- O primeiro é alegoricamente uma lembrança da paixão e sofrimentos de Cristo, uma recordação da justiça divina e uma imprecação contra os inimigos de Cristo e da Igreja – serve bem para pôr a alma diante da responsabilidade de não ofender a Cristo, diante da lembrança da morte e do inferno assim como para alimentar a esperança. Renova em outra chave o combate ao mundo e ao demônio que estava implícito no primeiro salmo das Primas.
2- O segundo é o De profundis, um dos salmos penitenciais, além de servir a esse propósito de emenda pelas faltas cotidianas fala de vigilância noturna (“mais que os vigias pela aurora espere Israel pelo Senhor”): mesmo dormindo velamos se nos pomos a dormir com esperança em Deus confiando. Há um apotegma que se um monge não pudesse jejuar por razões de saúde poderia com a força das vigílias fervorosas conhecer a glória que se esconde na vida monástica de busca por Deus. Renova em outra chave o combate à carne/concupiscências que estava implícito no segundo salmo das Primas.
3- O último é uma afirmação de busca pela humildade, inclusive citado na regra de São Bento. Serve para colocar a percepção da nossa pequenez diante da imensidão divina e assim tem algo do louvor do terceiro salmo de prima e renova de maneira bem explícita o combate ao orgulho e vanglória e ao demônio que inspira revolta contra Deus.
Vale lembrar que os salmos graduais são os salmos da “ascenção” e “subida”, da peregrinação e procissão ao Templo de Jerusalém. Em sentido espiritual cristão os Padres e São Bento interpretam eles como apontando o itinerário cristão de elevação espiritual para viver no verdadeiro terceiro templo que é o Corpo de Cristo como pedras vivas e espirituais. Com estes três salmos das Completas do Ofício Parvo romano (128 a 130) temos em miniatura o essencial dos graduais: as profundezas miseráveis de onde somos retirados pela bondade divina e elevados à vida sobrenatural; a cruz como caminho e busca de vida no templo, enfrentamento dos inimigos e encontro com Deus no santo dos santos (o coração aberto de Cristo); a humildade como condição de habitação na morada de Deus; a confiança em Deus e desconfiança em nós mesmos pois “se o senhor não edificar, em vão trabalham os que a constroem” e assim a importância da humilhação e confiança que aparecem nesses salmos.
Com este pequeno conjunto de seis salmos (juntando os da Prima e os das Completas) temos os seis dias da nova criação do homem para repousar no sábado do nunc dimittis que é nesta vida, à luz da fé, a salvação em Cristo; a morte como sono místico; enquanto aguardamos a vinda do oitavo dia que é a glória final.
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Para saber mais sobre o Ofício Parvo clique aqui.

Os leitores fieis sabem que sempre defendi o Ofício Parvo de Nossa Senhora como a melhor opção de Ofício Divino para os leigos e mesmo para certos religiosos de vida ativa. Não é a toa que criei uma página sobre o assunto, onde reúno o material que já publiquei sobre o tema, e folgo em saber que ela serviu para muitos conhecessem essa forma de oração litúrgica que ficou enterrada após o desastre conciliar.
Infelizmente, as edições físicas a venda no Brasil pecavam por uma certa falta de esmero; o relançamento do Horas Marianas pelo Diogo do Controvérsia Católica pareceu suprir essa lacuna, mas problemas na concretização da publicação e na logística de seu envio arrefeceram essa impressão. Além disso, embora cada uma delas tenha certos recursos positivos, nenhuma apresenta um equilíbrio entre as possibilidades existentes; por exemplo, enquanto a edição do Mosteiro da Santa Cruz me parece melhor para o neófito na organização do texto, já que os ofícios I, II e III são apresentados na sua integralidade, tirando a necessidade de muitas idas e vindas no livro, a do Horas Marianas resgata as comemorações opcionais de modo único, mas peca na organização.
Por isso incentivei e participei da construção de uma nova edição, que reúne o que há de melhor nas outras, e que traz uma grande novidade (que nenhuma outra edição comercial publicada no mundo tem): a notação gregoriana necessária para o canto do Ofício Parvo. Além disso, ela segue as rubricas de São Pio X, mas em anexo tem o necessário para quem quiser rezar o ofício seguindo o esquema legado por Trento.




A nova edição está em pré-lançamento, com um bom desconto no preço. Aproveitem!
A verdade sobre o Kyrie

O Kyrie eleison oferece uma distinção interessante entre a Missa no rito romano tradicional e a no rito paulino, mas a sua história também oferece um desafio interessante aos mitos contemporâneos sobre o desenvolvimento litúrgico. Muitas vezes se supõe que o Kyrie é um resquício da época em que a Missa era rezada em grego e, portanto, um sinal para nós de que, assim como a Missa foi mudada do grego para o latim, ela deveria ser mudada para o vernáculo. Nada poderia estar mais longe da verdade.
Ele foi introduzido na liturgia romana quando ela já era celebrada em latim há muitos anos. Não aparece em nenhum lugar do relato de São Justino Mártir e não está presente na liturgia norte-africana que seguia de perto o rito romano. Nenhum dos antigos escritores latinos, como Tertuliano ou São Cipriano, menciona o Kyrie, nem Santo Agostinho, que é posterior a eles. De onde o Kyrie veio então? Segundo alguns, São João Crisóstomo o introduziu na liturgia de Constantinopla, e a partir daí ele foi popularizado e adotado em outras liturgias. Por ser grego, em vez de ser traduzido para o latim, foi importado exatamente como estava. Aparece pela primeira vez nas liturgias galicanas, que eram uma liturgia oriental trazida para o Ocidente pelos patriarcas de Milão, e na liturgia romana os primeiros registros são do século VI. Nos ritos gregos fazia parte de uma ladainha, enquanto no Ocidente a forma de sua introdução alternava com a invocação Christe eleison, algo não visto na liturgia grega, ou em qualquer outra liturgia ocidental, exceto a moçárabe.

Como todos os anos, Karlos Guedes publica um ordo dominical e festivo para as Missas no rito romano tradicional que sempre divulgo. Este ano vou reblogar o post original dele, de modo que os leitores podem acessar o Ordo clicando na seção abaixo.
A declaração seguinte, de D. Athanasius Schneider, foi publicada em inúmeros lugares e traduzo para os leitores a versão que encontrei no blog Rorate Caeli.
A proibição da missa tradicional em latim é um abuso do poder eclesiástico e o descumprimento de sua proibição não constitui desobediência.
1. A tradicional liturgia romana da Missa era a liturgia de nossos ancestrais católicos. Foi a forma da Missa com a qual a maioria das nações europeias (exceto alguns países da Europa Oriental e as áreas sob os ritos ambrosiano e moçárabe), todas as nações americanas e a maioria das nações africanas, asiáticas e da Oceania foram evangelizadas.
2. “O que as gerações anteriores consideraram sagrado, permanece sagrado e grande também para nós” (Papa Bento XVI).
3. “O problema com o novo Missal reside no abandono de uma história sempre contínua, antes e depois de São Pio V, e na criação de um livro completamente novo (embora compilado de material antigo)” (Cardeal Joseph Ratzinger).
4. A “publicação do novo Missal foi acompanhada por uma espécie de proibição de tudo o que veio antes dele, o que é inédito na história do direito eclesiástico e da liturgia” (Cardeal Joseph Ratzinger).
5. “Posso dizer com certeza, com base no meu conhecimento dos debates conciliares e na minha leitura repetida dos discursos feitos pelos Padres Conciliares, que isso [isto é, a reforma como está agora no novo Missal] não corresponde as intenções do Concílio Vaticano II” (Cardeal Joseph Ratzinger).
6. A tradicional liturgia romana da Missa foi a liturgia de todos os santos de rito latino que conhecemos pelo menos durante todo o último milênio; portanto, sua idade é milenar. Embora comumente chamada de “Missa Tridentina”, a mesma forma exata da Missa já estava em uso vários séculos antes do Concílio de Trento, e esse Concílio pediu apenas para canonizar aquela forma venerável e doutrinariamente segura da liturgia da Igreja Romana.
7. A tradicional liturgia romana da Missa tem a mais estreita afinidade com os ritos orientais no testemunho da lei litúrgica universal e ininterrupta da Igreja: “No Missal Romano de São Pio V, como em várias liturgias orientais, há belas orações através das quais o sacerdote expressa o mais profundo sentido de humildade e reverência diante dos Sagrados Mistérios: elas revelam a própria substância da Liturgia” (Papa João Paulo II).
8. O Papa e os bispos não têm, portanto, autoridade para proibir ou limitar uma forma tão venerável da Santa Missa, que foi oferecida pelos santos por mais de mil anos, da mesma forma que o Papa ou os bispos não teriam autoridade para proibir ou reformar significativamente a forma venerável do Credo Apostólico ou do Niceno-Constantinopolitano, precisamente por causa de seu uso venerável, contínuo e milenar.
9. Cumprir a proibição abusiva daquela venerável forma da Missa dos Santos, ditada infelizmente pelos eclesiásticos atuais num tempo de crise eclesial sem precedentes, constituiria uma falsa obediência.
10. O descumprimento das proibições da Missa tradicional não torna ninguém, por isso, cismático, desde que se continue a reconhecer o Papa e os bispos e continue a respeitá-los e a rezar por eles.
11. Ao desobedecer formalmente a tão inaudita proibição de um patrimônio inalienável da Igreja Romana, obedece-se de fato à Igreja Católica de todos os tempos e a todos os papas que diligentemente celebraram e ordenaram a preservação daquela venerável e canonizada forma da Missa.
12. A atual proibição do rito tradicional da Missa é um fenômeno temporário e cessará. A Igreja Romana vive hoje uma espécie de exílio litúrgico, ou seja, a tradicional Missa latina foi exilada de Roma; mas o exílio, com certeza, um dia chegará ao fim.
13. Visto que a Missa latina tradicional está em uso ininterrupto há mais de um milênio, santificada pela recepção universal ao longo do tempo, pelos Santos e pelos Romanos Pontífices, ela pertence ao patrimônio inalienável da Igreja Romana. Consequentemente, no futuro, sem dúvida, os Romanos Pontífices reconhecerão e restabelecerão o uso daquela liturgia tradicional da Missa.
14. Os futuros Papas agradecerão a todos os sacerdotes e fiéis que, em tempos difíceis, apesar de todas as pressões e falsas acusações de desobediência, e com espírito de amor sincero pela Igreja e pela honra da Santa Sé, mantiveram e transmitiram a grande liturgia tesouro da Missa tradicional para as gerações futuras.
+ Athanasius Schneider
Festa de São Pedro & São Paulo, 29 de junho de 2023
Uma proposta de Shawn Tribe:
Uma das impropriedades divulgadas pelos neoconservadores na atualidade é a de que, de algum modo, o Concílio de Trento e o Papa São Pio V, criaram um novo Missal/rito litúrgico. Isso é frequentemente usado para justificar o que aconteceu após o encerramento do Concílio Vaticano II. A realidade é outra, mas se alguém realmente deseja fazer com que ela atinja seu alvo, um bom exercício seria executar uma “Missa seca” de acordo com uma edição anterior do Missale Romanum (como esta) e gravá-la, e depois mostrá-la lado a lado com a Missa do mesmo dia tirada de uma edição do século XX.
Mostre as orações de cada uma, mostre as cerimônias de cada uma e deixe-as serem observadas lado a lado.
Se você realmente quiser ser ambicioso, adicione uma terceira janela mostrando a Missa para o mesmo dia de acordo com o rito paulino utilizando as opções mais próximas (e mesmo feitas ad orientem para que ninguém tente usar essas coisas como uma desculpa para cancelar o exercício ).
Outra variante desse tipo de projeto seria simplesmente colocar o usus antiquiior por um dia ao lado da liturgia paulina para o mesmo dia com o mesmo propósito – destacando as diferenças.
É um projeto ambicioso, mas é o tipo de coisa que poderia causar mais impressão popular do que uma centena de ensaios sobre o tema (ensaios que também são necessários, mas destinados a outro público).