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Interpretação metafísica da teoria da evolução

Texto do confrade Rui:

EvolutionismGostaria de fazer uma interpretação metafísica ou ontológica da teoria da evolução, com base na causalidade, e submetê-la à apreciação dos confrades.

Em primeiríssimo lugar, não se trata de negar a teoria da evolução. Embora eu não seja evolucionista, considero que, em princípio, ela seria possível, mas, como a ciência moderna afastou-se das bases filosóficas que a sustentam, acho interessante fazer essa interpretação.

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Ciência Filosofia

Evolução: hipótese mista e outras considerações

Texto do confrade Rui Ribeiro Machado:

Coisas certas:

– Existe mutação (nunca, contudo, foi demonstrado que uma espécie pode se transformar em outra, admitindo que mudanças só acidentais não fazem indivíduos de espécies diferentes. A rigor, o lobo e o cão poderiam ser classificados na mesma espécie, já que a taxonomia nem sempre atenta para diferenças essenciais e sim acidentais).

– A paleontologia demonstra a existência de séries ordenadas de seres que apareceram e desapareceram, substituindo-se uns aos outros, segundo o desenvolvimento gradual de certos caracteres e o desaparecimento de outros. A isso, soma-se a evidência paleontológica de que as espécies não teriam todas aparecido conjuntamente.

– Semelhanças estruturais, genéticas, moleculares, não são provas de que uma espécie surgiu de outra, uma vez que todo organismo se compõe das mesmas estruturas, desde o átomo até o DNA ou a célula, e, por operar de maneira semelhante, deve ser composto também de maneira semelhante.

A dogmatização do transformismo reduz em muito as possibilidades. Uma coisa que nunca é pensada, nem por defensores cristãos do transformismo, nem do fixismo, é que, tanto a metafísica, quanto a Sagrada Escritura, admitem uma solução mista: é possível que Deus tenha criado um grupo de espécies inicial, e que, a partir daí, transformações dessem origem a novas espécies. Santo Tomás achava que minúsculos animais surgiram depois, até por geração espontânea. Portanto, quando o Gênesis diz que “Deus fez cada um segundo a sua espécie” (cf. Gn 1,21.24-25) não está indicando a impossibilidade de surgimento de novas espécies que, até então, não existiam.

Tampouco é preciso admitir que as espécies foram criadas por Deus todas na mesma ocasião, e não quando houvesse condições favoráveis à sua existência. Os seis dias da criação não precisam ser dias literais, embora haja toda uma lógica na descrição desses dias, revelada por Santo Tomás: eles formam uma série alternada de três etapas da criação: a criação, a diversificação e a ornamentação do céu, das águas e da terra:

Primeiro dia: diversificação do céu
Segundo dia: diversificação das águas
Terceiro dia: diversificação da terra
Quarto dia: ornamentação do céu
Quinto dia: ornamentação das águas
Sexto dia: ornamentação da terra

Uma dificuldade parece ser tirada dos teólogos e doutores da Igreja: todos, inclusive Sto. Tomás (S. Th., q.74, a.2, ad.3), admitem que Deus cessou de criar novas coisas após o tempo dos seis dias, fazendo, após isso, as coisas derivarem umas das outras. Mas, como vimos, não precisamos admitir que a criação das primeiras coisas se tivesse encerrado num período breve ou curto, devendo ser estendida, para ser fiel ao relato bíblico, até o tempo da criação do homem.

Objeção: Deus, ordinariamente, não cria senão por causas segundas.

Resposta: Quem pode admitir isso cientificamente? A teoria científica do Universo estacionário admite a criação de matéria nova, sem que isso seja um empecilho à própria teoria. O Big Bang, como evento no qual toda a matéria e energia teriam sido criados, é uma hipótese sujeita a revisões, e não é a única hipótese coerente com o cristianismo. Ainda que tenha havido o Big Bang, não é impossível a criação de coisas independente do Big Bang. As almas humanas são criadas por dia. Considerando o número de nascimentos que é por volta de centenas de milhares por dia e o número de abortos (embora eu não tenha pesquisado a proporção entre os dois), são multidões de almas que são criadas diariamente.

OBS:

Tanto o fixismo, quanto o transformismo, devem considerar as condições reais de vida em cada estágio da história terrena. Os fixistas (ou criacionistas) devem admitir que as espécies só foram criadas por Deus cumpridas as condições necessárias para a sua existência. Logo, as primeiras espécies teriam sido aquelas que poderiam resistir nas condições adversas do Período Arqueano. Não admitindo isso, o fixismo se torna inverossímil. Um texto da Montfort o admite claramente:

Evidentemente, nos primeiros tempos geológicos, a Terra não oferecia condições ambientais propícias à existência de vida. Só após alguns bilhões de anos, foi possível existirem as condições ambientais necessárias para que seres vivos pudessem existir. Estima-se que a Terra tem cerca de 4,5 bilhões de anos e que a vida só teria surgido entre 5 e 3,5 milhões de anos atrás, o que é um tempo relativamente curto.

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Eventos Filosofia

A Metafísica da Lei: uma visão tomista

Lei - tomismoProf. Sidney Silveira, grande conhecedor e principal divulgador da obra de Santo Tomás de Aquino no Brasil, além de coordenador de duas coleções de publicações de títulos medievais no Brasil, ministrará um minicurso em Sorocaba: «A Metafísica da Lei: uma visão tomista », promovido pelo IFE-Sorocaba. O minicurso acontecerá nos dias 22 e 23 de janeiro de 2016, na Faculdade de Direito de Sorocaba (FADI).

Abaixo, a ementa:

• PRIMEIRO DIA
Vínculos metafísicos entre o direito e a moral

1- A essência da lei
2- O fim da lei
3- Os efeitos da lei
4- O bem comum

• SEGUNDO DIA
Liberdade e lei

1- Os atos propriamente humanos
2- O ato moral
3- A vontade e a lei (interseções metafísicas)
4- A lei natural como ápice da liberdade humana.

Os interessados devem entrar em contato pelo e-mail: paulosvfonseca@gmail.com

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Filosofia

A impersonalidade do filósofo

Um trecho sensacional escrito por Sertillanges, em “As grandes teses da filosofia tomista” sobre a impersonalidade de Santo Tomás:

quoteAquela originalidade pretensiosa que procura pôr em relevo o pensador, essa é tão alheia a Santo Tomás, que nunca dele nos lembramos embora guiados pelo seu pensamento. É que ele pensa com tanta intensidade e pureza, concentra-se de tal modo no objeto que nenhuma atenção lhe fica para o sujeito que pensa. Absorve-se inteiramente na sua obra; não consente em sacrificar à ostentação a menor parcela do seu tempo tão precioso; não quer enfraquecer o espírito que julga já tão impotente perante as dificuldades da ciência. Tudo nele se coordena para o mesmo fim, sem aparecer a força coordenadora. Procura sintonizar o pensamento e o ser, tarefa eminentemente impessoal, empreendimento universal. Orientadas todas as suas energias para o fim a atingir, como havia ele de deter-se em exibições espetaculosas!

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Filosofia Política Sociedade

Veganismo faz mal à saúde física e mental

https://youtu.be/kwHdj02-2hg

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Filosofia

Deus poderia criar o mundo desde sempre?

Texto do confrade Rui Ribeiro Machado:

tempoRepugnaria a razão dizer que não, dado que seria limitar a potência divina a um determinado tempo. Deus pode criar num tempo, mas não antes, e se, antes, não anteriormente a isso, e, como Deus é eterno, em algum momento não poderia ter criado o que criou. Logo, Deus mudou, o que é absurdo.

Devemos, portanto, confessar que Deus poderia ter criado o mundo desde sempre. Mas, como resolver as dificuldades desse raciocínio, como por exemplo: Uma sequência infinita de eventos na origem dispensaria o Criador? Seria possível que um movimento que começasse no infinito chegasse ao agora?

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Direito Filosofia Sociedade

O direito e os fatos

Artigo do Professor José Luiz Delgado (Jornal do Commercio, Recife, 31 de março de 2015), que aborda uma das grandes confusões de hoje no meio jurídico: a falta de delimitação do objeto do direito. Esse problema, pelo que percebo, é artificialmente criado por aqueles que querem instrumentalizar o Estado para colocar em prática um verdadeiro laboratório de experimentos sociais, sempre justificando suas demandas pela existência factual dos elementos que visam proteger (por exemplo, constatar a existência de relações amorosas entre mais de duas pessoas seria o bastante para se pleitear a figura jurídica do casamento poliamoroso). Por outro lado, o texto também mostra como certas exigências de tradicionalistas ou neoconservadores (estranhas aos princípios primários da Lei Natural) não se sustentam fora de um contexto autoritário, já que é impossível para o direito continuar a valorar algo por muito tempo num sentido contrário do que “sente” a sociedade (como seria o caso de não dar nenhuma repercussão jurídicas às uniões estáveis).

Haveria uma “revolta dos fatos contra o direito”, como houve quem sustentasse? Ou o direito deveria sempre se amoldar aos fatos? Qual a verdadeira relação entre o direito e os fatos? Duas negações devem logo ser estabelecidas. Primeira, a de que o direito não produz fatos. Não produz riqueza, progresso, desenvolvimento (a não ser em pequeniníssima escala). Quem quiser reclamar do direito porque, diferentemente da economia, não produz progresso, equivoca-se redondamente: não sabe simplesmente o que o direito de fato é, e o que o direito realmente faz.

Segunda, a de que o direito também não é mera tradução dos fatos. Não se trata, no direito, de assumir os fatos, de aceitar os fatos, de se adaptar a eles. O propósito de simplesmente reconhecer os fatos, saber como as sociedades funcionam, identificar as formas habituais de relações sociais, é tarefa de outro saber: da sociologia, não do direito. O direito não se confunde, portanto, nem com a economia nem com a sociologia.

O que o direito é e o que essencialmente faz, é um julgamento dos fatos. Dados os fatos, dadas as maneiras habituais como os homens se comportam, uns diante dos outros, o direito avalia essas condutas para sobre elas proferir um julgamento: aprovar umas e condenar outras.

O direito vem sempre depois dos fatos. Não criando os fatos, o direito vem depois deles, mas não para se conformar com eles, e sim para os apreciar. Acontecem ou não, na sociedade, homicídios? Este é um fato social. Examinando-o, o direito vai proferir um juízo: dirá que os homocídios são, em princípio, inaceitáveis, mas definirá situações em que eles se justificam e também circunstâncias que agravam ou o atenuam.

O direito é um juízo de valor feito sobre os fatos da vida social. É a reflexão sobre os fatos, avaliação dos fatos. Reflexão que faz segundo a razão humana (o que inclui os ditames morais) e segundo o sentimento geral da sociedade (os valores reconhecidos pela sociedade na qual está inserido). E a faz sobretudo na perspectiva daquilo que deve ser exigido para a boa vida em sociedade: daquilo que o grupo social reputa como necessário para a boa convivência geral, como portanto devendo ser garantido pela força social organizada. Não na perspectiva daquilo que seriam determinações religiosas ou morais para a vida em sociedade. Todas essas determinações o direito leva em conta, sim, mas na sua perspectiva própria: a de saber quais delas devem ser impostas e cobradas dos homens pela autoridade social.

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Música e moralidade

Artigo do filósofo inglês Roger Scruton, publicado originalmente na revista American Spectator, e traduzido para o português por Hugo Medeiros (fiz pequenas modificações estilísticas):

músicaPlatão continua sendo o nosso melhor crítico de rock.

“Os modos de compor poesia e música não são alterados em qualquer lugar sem que haja uma mudança nas leis mais importantes da cidade.” Assim escreveu Platão na República (4.42c). A música, para Platão, não era um divertimento neutro. Poderia expressar e estimular a virtude – nobreza, dignidade, temperança, castidade. Mas também poderia expressar e estimular o vício – sensualidade, agressividade, indisciplina.

A preocupação de Platão não era muito diferente da de um homem moderno receoso com o caráter e o efeito moral do Death Metal, digamos, ou do kitsch musical do gênero de Andrew Lloyd Webber. “Os nossos filhos deviam estar ouvindo essas coisas?” é a pergunta que surge na mente dos adultos modernos, assim como “a cidade deveria permitir isso?” era a questão na mente de Platão.  Claro, há muito desistimos da ideia de proibir certos tipos de música por meio de leis. No entanto, é ainda comum acreditar que a música tem – ou pode ter – um caráter moral, e que o caráter de uma obra ou de um tipo de música pode “se impregnar” de alguma maneira em seus devotos.