Trago uma bela meditação, com adaptações, de um dos trechos mais difíceis da Sagrada Escritura: a parábola do administrador infiel (Lc XVI, 1-13), extraída do livro Reflexões Evangélicas, do Pe. Alexandrino Monteiro S.J. Em azul as palavras do Senhor, logo abaixo a sua respectiva meditação.

O administrador chamado a contas
Jesus disse ainda a seus discípulos: Um homem rico tinha um administrador e este foi acusado diante dele, por ter dissipado seus bens.
Este administrador, a quem o rico tinha confiado a administração de seus bens, em vez de os fazer render, dissipou-os servindo-se deles para seus próprios interesses. Este procedimento chegou a ser conhecido do senhor, que se encheu de cólera. Não sou eu este administrador infiel? Tudo que tenho, bens do corpo e da alma, da natureza e da graça, do nascimento e da fortuna; vida, saúde, riquezas, talentos . . . tudo recebi de vós, ó meu Deus, tudo vós me destes para vossa glória. Mas o uso que fiz de todos estes bens não estará atraindo sobre mim a vossa cólera?
E mandou chamar o administrador e lhe disse: Que ouço dizer de ti? Não ouço de ti senão queixas e todos reclamam minha justiça contra tua iniquidade.
Confesso, Senhor, que dei assunto a muitas queixas. Em todas as idades, Jogares, empregos, meus superiores iguais e inferiores, todos apelam para vossa justiça, pelo mau uso que fiz dos bens que me destes, pelas palavras, pensamentos e ações com que transgredi vossa lei!
Dá-me conta da tua administração.
Que golpe fulminante para este homem que nada tinha em ordem, que de tudo usa como proprietário para o fim de seus desejos! Agora se lembra que tem um senhor a quem é obrigado a dar conta!
Ó homens, a quem poucos anos restam de vida sobre a terra, esqueceis-vos que tendes um Senhor. a quem sereis obrigados a dar conta minuciosa de toda as vossas ações? Viveis esquecidos desse ultimo instante em que deveis responder por vós ao· Supremo Juiz?
Pois não poderás mais administrar, disse-lhe o Senhor.
Um dia virá também em que nos tirarão toda a administração e nos despojarão de tudo. Já veio para muitos que nós conhecemos: tão depressa virá também para nós! Então cessará para sempre a administração dos bens deste mundo! E como é que vivemos como se nunca o houvéssemos de deixar? Como se não tivéssemos de responder por cada ação? Como si uma eternidade de tormentos não fosse a paga de nossas infidelidades?
A Prudência do Administrador
Então disse ele a si mesmo: Que farei, pois meu amo me tirar a administração de seus bens? Cavar não posso e envergonho-me de mendigar.
O administrador viu-se numa angustiosa situação: urge tomar um partido para assegurar sua subsistência. Oh! Se pensássemos que em breve deixaremos a vida e que uma eternidade nos espera, como trataríamos a sério de nos prevenir para entrar nesse novo mundo, em que só nossas boas obras e virtudes nos prepararão uma vida feliz! – Quid faciam? – que é bem fazer agora, para então?
Já sei, disse, o que hei de fazer, afim de que, quando me tirarem o emprego, tenha gente que me receba em sua casa. Mandando, pois, chamar os que deviam a seu patrão, disse ao primeiro: Quanto deves a meu senhor? Ele respondeu: Cem cados de azeite. O administrador disse-lhe: Toma teu caução, senta-te depressa e escreve cinquenta. Depois disse a outro: E tu, quanto deves? O qual disse: Cem môios de trigo. Disse-lhe: Toma a tua letra e escreve oitenta.
E louvou o senhor o administrador infiel por ter procedido com prudência. O senhor não pôde deixar de louvar a indústria deste homem, que, por uma ação mais prudente que justa, preparou um recurso para quando fosse despedido do seu emprego. – Oh! Se fôssemos tão industriosos no que toca à nossa salvação! Perdoando as faltas do nosso próximo, dispomos a Deus para nos perdoar as nossas. Dando esmolas aos necessitados, granjeamos outros tantos amigos que nos receberão no céu. Nisto somos prudentes, sem sermos injustos.
Porque os filhos deste século são mais prudentes, nos negócios da vida, que os filhos da luz.
Os filhos do século são os que só pensam na vida presente. Os filhos da luz são os que pensam mais na vida futura e trabalham para salvar-se. Nós somos deste número, mas comparemos nossa prudência no negócio da salvação eterna, com a prudência dos mundanos nos negócios temporais, e vejamos como é superior a nossa.
Poder das riquezas
E eu vos digo: Empregai as riquezas iníquas em granjear amigos, afim de que quando falecerdes vos recebam nos eternos tabernáculos.
Jesus chama as riquezas do dinheiro de iniquidade – mamona iniquitatis – quer pelo uso que fazemos delas para o pecado, o luxo, o escândalo; quer pela maneira como as adquirimos: com avareza, crueldade, injustiças; quer pela maneira como as possuímos, pondo nelas o coração e tendo-as como o último fim da nossa vida.
É com elas que devemos granjear amigos no céu. E quais são esses amigos? Os pobres que preservamos do pecado, ajudando-os com esmolas; os servos de Deus, que vivem da caridade dos ricos; as pobres almas do purgatório, que, pelas Missas que por elas mandamos celebrar, sobem ao céu a interceder por nós.
E para que são estes amigos? Para nos receber nas moradas eternas. – Esta expressão é tão forte e enérgica que não a podemos explicar, sob pena de a enfraquecer: parece até exagerada se não fosse dita por Nosso Senhor e Mestre. Ó poder da esmola! Ó poder dos pobres! Ó poder dos Santos!